https://doi.org/10.19053/uptc.01227238.18115
Artículo de investigação
Por uma história comparada da
educação de jovens e adultos: uma defesa à luz da proposta de Saviani
Por una historia comparativa de
la educación de jóvenes y adultos: Una defensa a la luz de la propuesta de
Saviani
For a comparative history of adult
and youth education: aAdefense in light of Saviani’s proposal
Vinícius Figueiredo Costa[1]* https://orcid.org/0000-0001-7904-6180
Regina Magna Bonifácio de Araújo[2]* https://orcid.org/0000-0001-7289-5876
*Universidad
Federal de Ouro Preto, Minas Gerais,
Brasil
Resumo
Objetivo: Este texto tem como objetivo promover a discussão
sobre uma abordagem mais abrangente e crítica da história da educação, a
História Comparada como metodologia chave para o estudo aprofundado das
estruturas e sistemas que moldam o campo educacional mesmo no contexto
pós-moderno.
Originalidade/Contribuição: É enriquecer e
diversificar o discurso acadêmico, proporcionando uma compreensão mais completa
e multifacetada da história da educação e suas implicações para o presente e o
futuro, para além de certo status quo predominante nas metodologias
históricas utilizadas nos principais centros acadêmicos do país nas últimas
décadas.
Método/ Estratégia/Coleta de Dados: Enquanto as histórias pessoais são importantes por
capturar a diversidade de experiências e perspectivas, é igualmente crucial
situá-las dentro de um contexto histórico mais amplo para entender plenamente
seu significado e impacto. Este é o tema que se defenderá aqui, especialmente,
em contexto comparado.
Conclusões: Acreditamos que esse enfoque é
particularmente relevante na modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA),
onde se entende que tais metodologias são essenciais porque as propostas de
estudo nessa área, motivadas por ideais políticos, devem visar soluções
estruturais para os desafios enfrentados, indo além da análise individual de
casos isolados. Refletir sobre a EJA na América Latina e no Brasil transcende a
mera investigação acadêmica, envolvendo a formulação de soluções e a
implementação de políticas eficazes na área. Nesse contexto, as metodologias de
pesquisa desempenham um papel crucial, pois não apenas contribuem para o
conhecimento acadêmico, mas também servem como ferramentas para analisar
estruturalmente a realidade.
Palavras-chave: História comparada da educação; educação de jovens e adultos; história
da educação; metodologia.
Resumen
Objetivo: Este texto tiene como objetivo
promover la discusión sobre un enfoque más integral y crítico de la historia de
la educación, la Historia Comparada como metodología clave para el estudio en
profundidad de las estructuras y sistemas que configuran el campo educativo
incluso en el contexto posmoderno.
Originalidad/Aporte: es enriquecer y diversificar el
discurso académico, brindando una comprensión más completa y multifacética de
la historia de la educación y sus implicaciones para el presente y el futuro,
más allá de un cierto status quo predominante en las metodologías históricas
utilizadas en los principales centros académicos del país en los últimos años.
Método/Estrategia/Recolección
de información: Si bien las
histórias personales son importantes para capturar la diversidad de
experiencias y perspectivas, es igualmente crucial ubicarlas dentro de un
contexto histórico más amplio para comprender plenamente su significado e
impacto. Éste es el tema que se defenderá aquí, especialmente en un contexto
comparativo.
Conclusiones: Creemos que este enfoque es
particularmente relevante en la modalidad de Educación de jóvenes y adultos (EJA), donde se entiende que
tales metodologías son esenciales porque las propuestas de estudio en esta área
deben apuntar a soluciones estructurales a los desafíos enfrentados.
Reflexionar sobre EJA en América Latina y Brasil va más allá de la mera
investigación académica, involucrando la formulación de soluciones y la
implementación de políticas efectivas en el área. En este contexto, las metodologías
de investigación juegan un papel crucial, ya que no sólo contribuyen al
conocimiento académico, sino que también sirven como herramientas para analizar
estructuralmente la realidad.
Palabras clave: Historia comparada de la
educación; educación de jóvenes y adultos; historia de la educación;
metodología.
Abstract
Objective: This text aims to promote
discussion around a more comprehensive and critical approach to the history of
education, emphasizing Comparative History as a key methodology for in-depth
study of the structures and systems that shape the educational field, even
within the postmodern context.
Originality/Contribution: Is to enrich and diversify
academic discourse, providing a more complete and multifaceted understanding of
the history of education and its implications for the present and future,
beyond the prevailing status quo in historical methodologies. adopted in the
last years, by major academic centers in the country.
Method:/ Strategy/Data Collection: While personal histories are
important for capturing diverse experiences and perspectives, it is equally
crucial to situate them within a broader historical context to fully understand
their meaning and impact.
Conclusions: This is the argument that will be
defended here, within a comparative context. We believe that this approach is
particularly relevant in Adult and Youth Education (AYE). Such methodologies
are essential in this field because study proposals must offer solutions
aligned with the challenges faced. Reflecting on AYE in Latin America and
Brazil goes beyond mere academic research; it is also necessary to formulate
solutions and implement effective policies in the area. In this context,
research methodologies play a crucial role, as they not only contribute to
academic knowledge but also serve as tools for structurally analyzing
reality.
Keywords: Comparative history of education;
adult and youth education; history of education; methodology.
Recibido: 11/02/2024
Evaluado: 14/05/2024
Aprobado: 27/07/2024
Publicado: 01/09/2024
Introdução
O título deste artigo faz referência ao subtítulo conclusivo do artigo
“História Comparada da Educação: algumas aproximações” (Saviani, 2001)[3],
denominado “por uma história comparadada da educação brasileira”. Nesse trabalho o autor defende veementemente a História
Comparada como uma metodologia de extrema relevância quando aplicada à
educação. O argumento de Saviani serve como base deste estudo por apresentar
uma perspectiva contra-hegemônica em relação às metodologias predominantes do
campo da História da Educação Brasileira, principalmente, aquelas mais valorizadas a partir do
início do século XXI. Enquanto muitas abordagens do início desse século
privilegiaram a História Cultural, as Micronarrativas e, até mesmo, mas em
menor número, as Narrativas Autobiográficas, o artigo do filósofo brasileiro
desafia essa tendência e propõe uma visão alternativa de retorno à metodologia comparada, esta predominante nas ciências humanas na primeira
metade do século XX.
O domínio da História Cultural, a partir da década de setenta do último
século, refletiu uma mudança significativa na maneira como os pesquisadores
passaram a abordar o estudo da história da educação, afastando-se de modelos
macroestruturais de pesquisa e, de maneira pós-moderna, buscando grupos menores
para relatos de experiência em seus objetos de estudo. Se por um lado essas
novas metodologias enfatizaram a importância das experiências individuais, das
práticas culturais e das representações simbólicas na compreensão do
desenvolvimento educacional, por outro - em uma lógica de compreensão da
pós-modernidade como contrarrevolução do capitalismo sobre as mudanças sociais
- podem negligenciar ou minimizar outras dimensões igualmente relevantes, como
as estruturas políticas, econômicas e institucionais que moldam e são moldadas pelos sistemas sociais, a exemplo do
sistema educativo. Além disso, a ênfase nas metodologias derivadas da História
Cultural oriundas das reflexões de Certeau (1982)[4] e
Chartier (1990)[5],
por exemplo, podem limitar a compreensão da história da educação ao ponto de
vista, apenas, subjetivo, deixando de lado análises mais amplas,
contextualizadas e sistêmicas. Enquanto as histórias pessoais são importantes
por capturar a diversidade de experiências e perspectivas, é igualmente crucial
situá-las dentro de um contexto histórico mais amplo para entender plenamente
seu significado e impacto. E como se defenderá aqui, especialmente, em contexto
comparado.
A pós-modernidade citada, vale ressaltar, é compreendida
aqui, como o movimento filosófico que revisa as metodologias nas pesquisas das
ciências humanas a partir de certas leituras existencialistas de filósofos como
Sartre [6]
que contribuíram para essa crítica ao enfatizar a contingência e a incompletude
da existência humana e, por conseguinte, sua liberdade em relação às estruturas sociais:
Todas as barreiras, todos os parapeitos desabam, nadificados pela
consciência de minha liberdade: não tenho nem posso ter qualquer valor a
recorrer contra o fato de que sou eu quem mantém os valores no ser; nada pode
me proteger de mim mesmo; separado do mundo e da minha essência por esse nada
que sou, tenho de realizar o sentido do mundo e de minha essência: eu decido
sozinho, injustificável e sem desculpas. (Sartre, 1997, p. 84).
Há certa tendência, a partir do pensamento pós-moderno, a questionar e desconstruir
as narrativas dominantes e estruturais que moldam nossa compreensão da
realidade. Isso inclui uma análise crítica das estruturas de poder e dos
discursos hegemônicos que influenciam as práticas de pesquisa nas ciências
humanas. Autores existencialistas principalmente contribuíram para essa
desconstrução ao enfatizar a importância da liberdade e da responsabilidade
individual na construção da própria identidade e experiência. Ainda, de maneira
geral como indica Lyotard [7]
(2013), a pós-modernidade valoriza a multiplicidade de perspectivas e a diversidade de
vozes na produção do conhecimento. Isso implica em uma abertura para diferentes
abordagens metodológicas e uma valorização da heterogeneidade de experiências
e interpretações, podendo ser vista nesse contexto, ao enfatizar a
subjetividade e a singularidade da experiência humana. Geralmente isso se
traduz em uma valorização das narrativas pessoais e das experiências
individuais como fontes legítimas de conhecimento.
Tal fator influencia as metodologias de pesquisa nas ciências humanas,
promovendo uma abordagem mais participativa dos sujeitos pesquisados e que leve
em conta a diversidade de experiências e perspectivas desses mesmos sujeitos
envolvidos. Além disso, há, no pensamento pós-moderno, uma critica a noção de
totalidade e universalidade do conhecimento, argumentando-se em defesa de certo
relativismo perspectivo, sendo a verdade situada, apenas, dentre contextos
específicos. Isso implica em uma rejeição das metanarrativas que pretendem
oferecer explicações abrangentes e definitivas sobre o mundo, aspecto que, por
vezes, aparentemente, pode se chocar com o escopo da História Comparada.
Este artigo, todavia, visa realizar
uma discussão sobre uma abordagem mais abrangente e crítica da história da
educação. Isto, incluindo, a História Comparada como metodologia chave para o
estudo aprofundado das estruturas e sistemas que moldam o campo educacional
mesmo no contexto pós-moderno relatado. Em última análise, o objetivo aqui é
enriquecer e diversificar o discurso acadêmico, proporcionando uma compreensão
mais completa e multifacetada da história da educação e suas implicações para o
presente e o futuro, para além de certo status quo predominante nas
metodologias históricas utilizadas nos principais centros acadêmicos do país nas últimas décadas.
Ao defender essa abordagem, é essencial considerar as contribuições de
teóricos nacionais, a exemplo de Saviani, cujo trabalho ressalta a importância
de uma educação contextualizada e crítica, mas também sistêmica e estruturada.
Saviani (2001) argumenta que a História Comparada não apenas amplia os
horizontes dos estudantes que nela mergulham, mas também os ajuda a reconhecer
padrões, conexões e contradições ao longo do tempo e do espaço. Essa consciência histórica também é fundamental para o desenvolvimento de uma visão mais reflexiva sobre
questões contemporâneas - como desigualdade social, educação e identidade
cultural - majoritariamente lidas pela ótica subjetiva trazida com a
pós-modernidade. Assim, a abordagem comparativa na história da educação não apenas amplia os horizontes dos estudantes e
pesquisadores, mas também os capacita, de maneira geral, a compreender as
nuances e complexidades das sociedades ao longo do tempo e em diferentes partes
do mundo na lógica da estrutura, e, não apenas, do indivíduo.
Especificamente, ao considerar a importância da História Comparada na Educação de Jovens e Adultos (EJA),
é vital reconhecer não apenas sua capacidade de enriquecer o conhecimento
histórico sobre o tema, mas também seu potencial para promover o pensamento
crítico, a consciência social e a inclusão dos estudantes dessa modalidade. Ao
seguir o caminho indicado por Saviani, e também por outros teóricos
comparativistas, a pesquisa em EJA pode apontar alguns caminhos a serem
abordados para além dos problemas pesquisados. A complexidade em História
Comparada vale ressaltar, é entendida como valor de interconexão e não como
adjetivo vazio sobre o todo. Todavia, justamente a interconexão entre a
História Comparada e a Educação de Jovens e Adultos (EJA) representa uma
abordagem metodológica ainda pouco explorada neste campo de estudo.
A História Comparada oferece uma estrutura valiosa para estabelecer
paralelos entre diferentes contextos educacionais, permitindo uma análise
profunda dos fatores históricos, sociais e culturais que influenciaram, por
exemplo, a evolução da EJA ao longo do tempo. Ao adotar essa perspectiva seria
possível examinar, por exemplo, como a educação foi concebida, implementada e
adaptada por aqueles agentes envolvidos no desenvolvimento dos programas de EJA
nas nações de um determinado recorte (geográfico, histórico, social). Isso
possibilitaria uma compreensão mais ampla das dinâmicas educacionais, das
políticas e práticas adotadas em diferentes lugares e momentos históricos. Além
disso, a análise comparativa permite, até mesmo, uma apreciação mais profunda
das especificidades local ao se buscar perceber as influências globais na
formação e implementação de políticas educacionais para o estudante de EJA em
diversas localidades e tempos.
A integração da História Comparada na pesquisa sobre Educação de Jovens e
Adultos representa uma abordagem promissora que pode contribuir
significativamente para o avanço teórico e prático desse campo de estudo,
fornecendo novas perspectivas e oportunidades para a reflexão crítica e
sistêmica, sem desprezar o olhar subjetivo das concepções metodológicas mais
contemporâneas. Assim, especificamente a EJA se beneficia enormemente da
História Comparada devido à diversidade de experiências e perspectivas presentes
nessa modalidade de ensino, bem como de semelhanças advindas de uma lógica de
exclusão que permeia as múltiplas realidades de EJA. Por um lado, muitos jovens
e adultos trazem consigo uma riqueza de vivências pessoais e culturais que
podem ser integradas de forma significativa ao estudo comparativo da história.
Ao reconhecer e valorizar essa diversidade, os educadores podem criar um
ambiente de aprendizado onde as diferentes vozes e experiências são respeitadas
e valorizadas. Por outro, ao buscar as semelhanças dos processos do uso da
História Comparada na EJA, é crucial destacar não apenas seu papel na ampliação
do conhecimento histórico, mas também seu poder de promover a reflexão crítica
e a compreensão intercultural, capacitando uma discussão sistêmica em um mundo
cada vez mais complexo e interconectado. Ao invés de estudar eventos isolados
ou limitados a uma única perspectiva, a abordagem comparativa permite analisar
e contextualizar diferentes experiências históricas, culturais e sociais. Isso
não apenas enriquece a compreensão da diversidade humana, mas também capacita o
sujeito a questionar e refletir sobre as estruturas sociais, políticas e
econômicas em que estão inseridos.
Debate sobre
metodologia comparada
Em termos gerais, o campo da história comparada visa a uma abordagem
analítica que busca compreender fenômenos históricos ao examinar semelhanças e
diferenças entre diferentes contextos, sociedades, culturas ou períodos
temporais. Este campo de estudo utiliza a comparação como um método fundamental
para investigar e analisar padrões, processos e mudanças ao longo do tempo. Na
história comparada, os historiadores buscam identificar similaridades e
contrastes entre diferentes realidades históricas para revelar relações
causais, conexões, influências mútuas e padrões recorrentes. Isso pode envolver
a análise de eventos políticos, econômicos, sociais, culturais e outros
aspectos da vida humana em diferentes lugares e épocas.
Os historiadores comparativos podem adotar diferentes abordagens e
técnicas. Podem examinar casos específicos para destacar suas semelhanças e
diferenças, buscando entender como determinados eventos ou processos ocorrem de
maneira similar ou diferente em contextos variados. Além disso, podem utilizar
métodos quantitativos para analisar dados e estatísticas em uma escala mais
ampla, com o intuito de identificar padrões históricos. Essa metodologia também
permite aos historiadores identificarem influências mútuas, processos de
mudança, continuidades históricas e impactos de eventos em diferentes
sociedades. Ao comparar, por exemplo, sistemas políticos, estruturas sociais,
movimentos culturais ou eventos históricos, os estudiosos podem destacar
semelhanças que revelam conexões transculturais ou globalizações históricas,
bem como diferenças que apontam para especificidades regionais ou contextuais.
Em resumo, a história comparada é uma abordagem que enfatiza a análise de
semelhanças e diferenças entre diferentes contextos históricos, oferecendo uma
perspectiva mais ampla e uma compreensão mais profunda das dinâmicas
históricas.
Em termos de pesquisa, a metodologia comparada encontra-se em um
interessante momento como campo de conhecimento historiográfico no século XXI.
Ao mesmo tempo em que seus pressupostos básicos inerentes a ideia de uma
história problema são geralmente validados na comunidade acadêmica - por
representar uma crítica aos modelos histográficos nacionalistas, positivistas e
de relatos que compuseram a formação da ciência histórica no século XIX -
também enfrenta a crítica da história social e cultural, entre outras correntes
historiográficas, tanto pelo viés do pensamento estruturalista econômico
marxiano por exemplo, quanto pelos pensamentos pós-modernos quando estes se
deparam com os pressupostos de análise múltipla e com um recorte mais amplo do
que se costuma sugerir nos estudos acadêmicos orientados por metodologias
pós-moderna como aqui já discutido. É por isso um campo historiográfico de alta complexidade e de potenciais
armadilhas para o pesquisador, pois facilmente pode-se entrar em visões que
caiam em anacronismos, analogias apressadas, generalizações falaciosas,
induções sem provas entre outros modelos de análise que são fortemente
criticados, corretamente, pelas Academias no fazer histórico comum. Assim, as
metodologias comparadas mostram-se como uma crise e um risco, mas também por
esses fatores uma oportunidade, para o pesquisador que se dedica aos estudos
comparados. Como salienta, Barros (2004. p.2):
“...a História Comparada sempre se mostra como um insistente convite para
que o historiador repense a própria ciência histórica em seus dois fazeres mais
irredutíveis e fundamentais – de um lado, o ‘estabelecimento do recorte’, e, de
outro lado, o seu modo de tratamento sistematizado das fontes e dos dados e
processos investigados” [8]
Comparar é uma forma específica de propor e pensar as questões a partir das
respostas efetivamente originais as indagações de hipótese e metodologia da
pesquisa permitindo-se a análise para além dos relatos da fonte e sem
relativização teórica por uma percepção fragmentada da verdade. Isso não
significa o abandono do rigor metodológico, pelo contrário. Mas uma abertura
para um método que não asfixie o pesquisador em análise dos documentos e fontes
para construção da percepção histórica, ao mesmo tempo em que não o jogue em um
mundo de pós-verdade aonde tudo seja, apenas, narração.
A ideia de usar modelos comparativos para análise social, antes mesmo de
uma lógica histórica comparativa propriamente dita, é consequência do ideal
universalista moderno consolidado pelo iluminismo na modernidade. Não que não
existissem perspectivas comparativas no mundo antigo ou moderno, pois elas
existiram como exemplificam as narrativas biografias geminadas “Vidas
Paralelas” de Plutarco[9]
na Antiguidade Clássica. Afinal comparar é um fenômeno humano de análise e
percepção do mundo comum aos sujeitos históricos. Mas é no
mundo moderno europeu que essas comparações ganham perspectivas de análise,
principalmente dentro da área da filosofia política, nas sociedades europeias,
para além dos relatos presentes na Antiguidade e Medievalidade.
Em um primeiro momento, para o europeu do século XVIII chamava a atenção à
importância de um comparativismo histórico, principalmente no estabelecimento
de parâmetros de comparação entre metrópole e colônia no contexto em que os
principais países europeus possuíam territórios na América. Pensando em um
sentido universalista iluminista, autores como Voltaire, Rousseau, Montesquieu
tendiam a pensar em uma única natureza humana e por isso se interessavam e
perceber as diferenças entre as comunidades europeias e ameríndias como uma
questão essencialmente social ao mesmo tempo em que o comparativismo histórico
exaltaria a existência de leis humanas universais.
No século XIX, em um segundo
momento, o historicismo dominante na perspectiva da ciência histórica e sua
exaltação das particularidades, tornaram as ciências sociais o grande campo de
estudos comparados e não mais a história. Com a sociologia procurando-se
apartar das ciências históricas e seu viés historicista, os precursores da
sociologia europeia logo se interessaram pelos estudos comparados. Em ambos os
momentos dos estudos comparados citados, político iluminista e o sociológico
evolucionista, observa-se o uso das comparações nos estudos humanos em uma
lógica de dominação e hierarquização europeia naquilo que hoje, por um olhar
cada vez mais descolonial, pode se afirmar como eurocentrismo.
Não é ao acaso, portanto que os estudos comparados gerem receio entre
pesquisadores oriundos de povos colonizados, afinal suas premissas estavam
intimamente ligadas às justificativas de poder eurocêntricas. Todavia, como
campo teórico metodológico, a história comparada não se resume aos
ideais precursores. Pelo contrário, ao reconhecer a proposta hierárquica
europeia, quando os estudos comparados não se submetiam a um rigor histórico,
muito se ganha ao se perceber as diferenças entre o simples comparativismo
histórico e a História Comparada. No primeiro parte-se de algo intuitivo, comum
ao ser humano, que compara para poder se entender no mundo a partir
primeiramente de si. Já no segundo o problema discutido, inclusive, emerge mais
do que a comparação em si.
Os clássicos da sociologia: Durkheim com sua busca de leis gerais
universais por meio do fato social; Weber pelo seu modelo de análise humano por
meio do tipo ideal - além da sua obra comparativa sobre o Capitalismo e
Protestantismo - e Marx na construção do Materialismo Histórico estruturado
como unidade de análise a infraestrutura econômica, se permitiram, de algum
modo, os estudos comparativos, reforçando esse viés de análise na transição do
mundo moderno para o contemporâneo. É no século XX, todavia, após a primeira guerra, que a História Comparada passa a ter um destaque nas
pesquisas das ciências humanas. A história das
civilizações, e sua consequente proposta comparada, passam a se destacar até
mesmo na tentativa de compreender o que levou as nações do globo ao confronto
mundial e às crises do século XX. É a análise das civilizações
de maneira comparada o último momento antes da criação de uma historiografia
específica, teórica e metodológica, dentro da Escola de Analles,[10]
chamada História Comparada que serve como instrumento teórico aos
pesquisadores. Assim, a partir da consolidação da história comparada é possível
sair das macronarrativas que tem por objetivo a comparação com finalidade
política na produção de comparações metanarrativas, para, até mesmo, uma
história comparada do cotidiano, das micropolíticas no sentido de Foucault
(1973).
Nesse sentido, o estudo sobre a educação é um fenômeno, também, do campo
histórico e não, apenas, um saber especificamente de estudo do campo
pedagógico. Tal percepção é fundamental, ao se pensar a História da Educação,
para que se admita nesse campo de conhecimento a necessidade dos estudos
estruturados a partir da teoria e metodologia histórica. A História da
Educação, assim como se faz – costumeiramente - na História da Arte ou da
Ciência nos campos de estudos históricos, é um campo que pode ser compreendido,
inclusive, como uma especificidade na história. Todavia, é, no mínimo, curioso
que a educação como temática histórica, não conste em geral com uma matéria dos
cursos universitários de graduação e pós-graduação de História no Brasil,
cabendo às reflexões históricas sobre a educação aos próprios
cursos de Pedagogia, ou em sua origem de estudos no Brasil, a reflexões de
sociólogos e filósofos sobre o tema. Tal visão estruturada de grande parte das
Academias Brasileiras, inspiradas em geral nos modelos franceses de organização
curricular nas ciências humanas, coloca, por vezes, a educação como uma matéria
a parte da historicização, metodológica e teórica, pelo campo da história. A
História da Educação feita no Brasil, geralmente, resumiu-se no século XX aos
relatos históricos do passado que permitiram a chegada até os dias atuais, ou
as propostas educacionais, críticas ou assertivas, por uma ótica sociológica,
inspirada geralmente em modelos reflexivos sociológicos clássicos, como a
reflexão educacional de Durkheim, ou na sociologia contemporânea, como de
Bourdieu e Bernstein no século XX, mas não uma reflexão historiográfica sobre
como se produz a história da educação feita no país. Por isso os estudos
comparados na educação muitas vezes foram realizados sem se pensar a
metodologia histórica ao olhar para o passado ou ao comparar sociedades, ou ao
se pensar modelos sociais onde a educação é tema de estudo. Especificamente
quando se pretende o uso do modelo comparado na educação, cai-se, por vezes, em
uma analogia dos fatos de contextos diferentes de abordagens educacionais, mais
do que em unidades analíticas comparativas entre os elementos estudados. Por
vezes, ainda, compara-se por comparar pois tudo é possível, principalmente
dados, de serem estudados de maneira comparada, mas isso não é o mesmo que
fazer História Comparada da Educação. Afinal ao comparar os dados do Índice de Desenvolvimento Brasileiro (IDEB)
brasileiro, por exemplo, com aqueles presentes na Finlândia ou Coreia do Norte
pouco se aprende sobre a História da Educação destes países só por essa
comparação. Até mesmo pode-se cair em visões equivocadas de percepção se a
comparação se der sem uma metodologia rigorosa de análise ao se propor estudo
comparado. Para evitar a comparação pela comparação, deve-se pensar a luz de
Saviani (2001), quatro conceitos distintos sobre a educação e comparação,
apresentados a seguir.
Educação
comparada
Como apresenta Saviani[11]
os estudos de educação comparada têm suas raízes no início do século XIX.
“Admite-se, como marco inicial desses estudos, a obra de Marc- Antoine Julien, Esboço
e considerações preliminares de uma obra sobre a educação comparada, publicada
em 1817”. Nessa época, o interesse por comparações entre os sistemas
educacionais surgia em consonância com a organização dos Estados Nacionais e
seus respectivos sistemas de ensino. À medida que as nações emergentes buscavam estruturar seus sistemas
educacionais, tornou-se comum a prática de realizar viagens de estudo,
conduzidas por autoridades educacionais ou designadas por elas. Os relatórios
dessas viagens visavam auxiliar na organização dos sistemas educacionais dos
países financiadores dessas iniciativas.
Já no século XX, foram publicados manuais e tratados sobre educação
comparada. Essas obras oferecem uma ampla gama de perspectivas, teorias e
metodologias para examinar as diferenças e semelhanças dos sistemas
educacionais ao redor do mundo. Ao longo desse período, os estudiosos e
especialistas em educação comparada contribuíram significativamente para o
campo, fornecendo sugestões valiosas sobre políticas educacionais e práticas
pedagógicas: Parte superior do formulário
[...] no século XX, surgimm manuais ou tratados de educação comparada como
os de Kandel (1933), Estudos em educação comparada, Rodrigues (1938), Educação
comparada: tendências e organizações escolares, Hans (1949), Educação
comparada, Lourenço Filho (1961), Educação comparada, Holmes (1965), Problemas
de educoçâo, uma abordagem comparada, Vexliard (1967), Pedagogia comparada:
métodos e problemas e, a partir de 1955, as publicações da UNESCO que permitiam
uma visão mais ampla dos sistemas de ensino da quase totalidade dos países.[12]
Entretanto, mesmo com esses avanços, nota-se uma lacuna significativa: a
ausência de elementos da metodologia histórica para a realização da comparação.
A compreensão das práticas educacionais em diferentes contextos temporais é
essencial para uma análise abrangente e contextualizada. Portanto, a
incorporação de abordagens metodológicas históricas é fundamental para
enriquecer a análise comparativa e promover uma compreensão mais profunda das
dinâmicas educacionais ao longo do tempo. Só a educação comparada desvinculada da história, pouco se contribui como metodologia de pesquisa.
História
Comparada
Como dito, a escola dos Annales, originada no século XX, é um marco
importante na historiografia e fundamental para a lógica de História Comparada:
“o significado, importância, vantagens e riscos da história comparada foram
objeto de preocupação de historiadores como Bloch (1930), Barraclough (1969),
Febvre (1970), Genovese (1971) e Klein (1967)”. [13]
Seus objetivos incluíam a busca pela cientificidade, visando estabelecer a
história como uma disciplina rigorosamente científica, empregando métodos de
pesquisa e análise precisos. Além disso, buscava-se a transição da simples
descrição dos eventos históricos para a exploração das causas por trás dos
ocorridos, procurando explicações mais profundas e complexas. A abordagem annalista
também promovia o desenvolvimento e teste de hipóteses sobre processos
históricos, permitindo a formulação de generalizações embasadas em evidências.
A História Comparada, desde seu surgimento, tem desempenhado um papel
fundamental na ampliação da compreensão das relações temporais e espaciais.
Suas vantagens são interessantes de serem observadas, destacando-se em especial
quatro procedimentos propostos por Jürgen Kocka (2003). Primeiramente, a
heurística revela-se como uma ferramenta poderosa ao pesquisador, permitindo
identificar aspectos que normalmente passariam despercebidos ou negligenciados,
enriquecendo a visão histórica ao encontrar o que não foi dito explicitamente
nas fontes. Em segundo lugar, a abordagem descritiva da História Comparada,
permite observar as singularidades e peculiaridades dos objetos de estudo,
enriquecendo a compreensão da diversidade histórica e evitando generalizações
simplistas. Além disso, a análise comparativa capacita os historiadores a
testar hipóteses e aprofundar suas investigações, permitindo a identificação e
avaliação de causas subjacentes aos eventos históricos e não somente presas ao
positivismo histórico da descrição dos fatos. Por último, mas não menos
importante, o pragmatismo da História Comparada busca expandir os horizontes da
pesquisa ao sair do terreno individual-familiar, possibilitando uma análise
mais ampla, profunda e sistemática dos fenômenos históricos através da
comparação entre contextos diferentes e estruturais das sociedades comparadas.
No entanto, essa abordagem não estava isenta de riscos quando se pensa uma
metodologia comparada. Entre eles, destacava-se o anacronismo, que poderia
distorcer a compreensão do passado ao interpretar eventos históricos com base
em conceitos ou valores contemporâneos projetados sobre o passado. Havia também
o risco de sobrevalorizar o método em detrimento da narrativa histórica e de
realizar uma mera justaposição de descrições, sem uma análise interpretativa
mais profunda. A aspiração de neutralidade na pesquisa histórica poderia também
resultar em uma abordagem distanciada das complexidades humanas subjacentes aos
eventos históricos, como vários críticos a posterióri[14] propuseram.
Além disso, atualmente pode-se pensar que o enfoque estruturalista adotado por
alguns representantes dos Annales poderia não ser adequado para
compreender um mundo cada vez mais diverso e pluralista, característico da era
pós-moderna. Apesar dos desafios e críticas enfrentados, a abordagem dos Annales
foi fundamental para transformar a prática historiográfica. No entanto, isso
também destaca a necessidade contínua de reflexão sobre os métodos e objetivos
da disciplina histórica. Parte superior do formulário
História da
educação comparada
De maneira geral, a história da educação comparada faz parte do que
atualmente é conhecido nos cursos de graduação em Pedagogia e pós-graduação
como história das disciplinas:
“Trata-se, nesse caso, de se investigar a trajetória da educação comparada
desde suas origens até os dias atuais. Ao que parece, este é um campo ainda
inexplorado à espera de alguém que se disponha a levantar, organizar, analisar
e criticar as fontes disponíveis, sistematizando os resultados alcançados.” [15]
Remontar a ideia do que hoje é conhecido na Pedagogia como história das
disciplinas implica em uma investigação profunda que abrange não apenas a
evolução temporal, mas também os contextos culturais, políticos e sociais que
influenciaram a formação e o desenvolvimento das disciplinas escolares ao longo
do tempo. No caso específico da História da Educação Comparada brasileira, essa
trajetória remonta aos primórdios do século XIX e se estende até os dias
atuais, refletindo um constante processo de adaptação e transformação:
A educação comparada no Brasil já teve dias melhores. Além do trabalho
pioneiro de Milton C. da Silva Rodrigues, Educação comparada: tendências e
organizações escolares, publicado pela Companhia Editora Nacional em 1938,
seguido das traduções de Kandel, de Nicholas Hans e de Vexliard, assim como da
publicação do livro de Lourenço Filho, chegamos a ter uma “Sociedade Brasileira
de Educação Comparada” que organizou o Vl Congresso Mundial de Educação
Comparada, realizado no Rio de Janeiro de 6 a 10 de julho de 1987 que reuniu,
em torno do tema “Educação, crise e mudança”, 553 congressistas integrando
delegações de 43 países.[16]
Ao longo do século XX, a Educação Comparada passou por diversas fases de
desenvolvimento, influenciada por eventos históricos como guerras mundiais,
movimentos de descolonização e avanços tecnológicos em um mundo globalizado e
interconectado. Saviani (2001), em seu artigo traz uma perspectiva comparativa
entre as percepções predominante na disciplina de Educação Comparada nas
décadas de sessenta e oitenta. Na década de sessenta, havia uma visão otimista,
centrada nos termos “modernização”, “desenvolvimento” e “transformação social”.
Por outro lado, na década de oitenta, predominavam expressões como
“necessidades básicas”, “produção de renda” e “emprego”, refletindo um cenário
mais pessimista em relação a esse campo de estudo. De maneira geral,
anteriormente, na década de sessenta, o tema dominante era a expansão da
educação, enquanto na década de oitenta, o foco mudou para a contenção das
questões sociais.
Se anteriormente ao pensamento pós-moderno, acreditava-se na capacidade das
escolas de melhorar a sociedade em longo prazo, após o discurso pós-moderno,
aliado ao discurso do capital, surge a ideia, inclusive, de que as escolas
públicas apenas exacerbavam as desigualdades. Saviani[17]
ressalta a importância da abordagem histórica para explicar essa mudança de
visão. Ainda, na década de sessenta, o otimismo era baseado em pesquisas
históricas que abrangiam séculos, enquanto na década de
oitenta a decepção estava ancorada em estudos de curto prazo, que questionavam a
capacidade das escolas de promover mudanças econômicas e sociais. A ótica
temporal de comparação molda, assim, a realidade enxergada.
História
comparada da educação
Ainda tendo como base Saviani (2001), o filósofo aponta que a história
comparada da educação é algo que, no Brasil ainda está por ser feito. Ele
destaca algumas dificuldades que impedem o avanço nesse campo e que podem ser
resumidas aqui em dois pontos centrais e que serão abordados a seguir.
Primeiramente, o intercâmbio nacional e internacional educacional
desempenha um papel fundamental no avanço da pesquisa em História Comparada da
Educação. Quando os pesquisadores e as instituições de diferentes países e
culturas colaboram e trocam conhecimentos, isso não apenas enriquece as
perspectivas e abordagens dentro do campo, mas também promove uma compreensão
mais ampla e holística dos sistemas educacionais em todo o mundo. Por meio do
intercâmbio internacional, os pesquisadores têm a oportunidade de comparar e
contrastar práticas educacionais, políticas e abordagens pedagógicas em
diferentes contextos culturais e socioeconômicos. Isso permite uma análise mais
profunda das influências históricas, sociais e políticas que moldaram os
sistemas educacionais em todo o mundo. Além disso, o intercâmbio nacional e
internacional facilita a colaboração em projetos de pesquisa conjuntos,
permitindo que os pesquisadores combinem seus recursos, experiências e
perspectivas para abordar questões complexas e interdisciplinares na história
comparada da educação.
Essa colaboração também pode levar ao desenvolvimento de redes de pesquisa
internacionais, onde os pesquisadores podem promover aquilo que o mundo
contemporâneo exige aos programas de pós-graduação: a inovação e a excelência
na pesquisa educacional. Portanto, a falta de intercâmbio entre pesquisadores e
instituições de diferentes países e culturas representa uma barreira
significativa para o desenvolvimento da História Comparada da Educação. Superar
essa lacuna requer um esforço concentrado para promover a colaboração e a troca
de conhecimentos em nível nacional e internacional, visando assim avançar o
conhecimento e compreensão dos sistemas educacionais em todo o mundo.
Aliado a isso, mas como um segundo ponto, a ausência de projetos de
pesquisa conjuntos entre universidades de diferentes países representa não
apenas uma lacuna na área da História Comparada da Educação, mas também uma
oportunidade perdida para promover avanços significativos e abordagens inéditas
dentro do campo. A colaboração internacional em projetos de pesquisa é
essencial para enfrentar os desafios complexos que permeiam o estudo
comparativo da educação em diferentes contextos culturais e socioeconômicos.
Quando as universidades não colaboram em projetos de pesquisa conjuntos, há uma
falta de aproveitamento do vasto conhecimento e experiência acumulados em
diferentes partes do mundo. Isso impede a troca de ideias, o compartilhamento
de recursos e a cooperação em metodologias de pesquisa, limitando assim o
potencial dos estudos comparados. A colaboração internacional em projetos de
pesquisa também oferece a oportunidade de abordar questões e desafios globais
que transcendem fronteiras nacionais, algo cada vez mais importante e caro ao
século XXI. Ao reunir pesquisadores de diversas origens, é possível adotar uma
abordagem mais abrangente e multifacetada para compreender as complexidades dos
sistemas educacionais em escala global. Além disso, a cooperação em projetos de
pesquisa conjuntos pode levar ao estabelecimento de parcerias duradouras entre
instituições acadêmicas, promovendo o intercâmbio contínuo de conhecimentos e
recursos. Portanto, é crucial que as universidades de diferentes países se
engajem em projetos de pesquisa conjuntos na área da História Comparada da
Educação. Derivado desse segundo tema vale mencionar, ainda, que há poucas
linhas de pesquisa estabelecidas dentro desse campo de estudo. A falta dessa
organização de estudos e consolidação no campo da História Comparada da
Educação dificulta a identificação de temas e abordagens relevantes e a
sistematização dos estudos realizados:
Considero essa linha de investigação de grande relevância e, mesmo, uma
condição para se colocar, de forma mais precisa, a questa”o da viabilidade,
alcances e limites dos estudos de hist6ria comparada da educação entre o Brasil
e os outros países. Com efeito, é a partir daí que será possível distinguir
entre o que é próprio da educação brasileira como um todo e aquilo
que é específico de cada uma das diferentes regiões que compõem o nosso país.
Portanto, senão antes, ao menos concomitantemente, a par do intercâmbio
internacional entre pesquisadores de história da educação do Brasil e de outros
países, será necessário intensificar o intercâmbio nacional entre os
historiadores da educação dos vários Estados do Brasil. Com esse objetivo
caberia formular projetos conjuntos de investigação no âmbito da história
comparada da educação envolvendo pesquisadores de diferentes Estados o que,
atualmente, resulta facilitado uma vez que dispomos de uma instância de
articulação propiciada pela Sociedade Brasileira de História da Educação.[18]
Saviani pensa, como grande desafio brasileiro, a consolidação da Sociedade
Brasileira de História da Educação. Nesse sentido, especificamos em
alicerce a Saviani, há necessidade de a História Comparada ser metodologia
essencial aos estudos produzidos no campo da EJA.
Por uma história comparada da
educação na EJA
A ampliação do conceito de história comparada para a EJA envolve uma
mudança de paradigma trazida na abordagem da História Comparada da Educação,
priorizando unidades comparativas em detrimento, por exemplo, do uso de
analogias como feito na História Comparada em si. Isso implica em um enfoque
mais cuidadoso e crítico na seleção das unidades de análise, buscando
identificar características específicas e comparáveis em diferentes contextos
educacionais. Em vez de simplesmente traçar analogias superficiais entre
sistemas educacionais diferentes, a ênfase é colocada na identificação de
unidades comparativas sólidas, como políticas educacionais, estruturas
curriculares, práticas pedagógicas e seus impactos sociais, econômicos e
culturais. Isso permite uma análise mais precisa e contextualizada das
semelhanças e diferenças entre os sistemas educacionais em estudo. Além disso,
a abordagem centrada em unidades comparativas visa evitar os já citados
anacronismos, ou seja, a interpretação de eventos históricos com base em
conceitos ou valores contemporâneos sobrepostos há tempos diferentes. Em vez
disso, busca-se compreender os sistemas educacionais em seus contextos
históricos e culturais, reconhecendo as nuances e complexidades de cada período
de tempo.
Outro aspecto importante é a cautela em relação a generalizações excessivas
e induções precipitadas. Em vez de extrapolar conclusões amplas com base em um
número limitado de exemplos, a abordagem baseada em unidades comparativas
incentiva uma análise mais detalhada e contextualizada a partir de um centro
focal, levando em consideração a diversidade e a heterogeneidade daquilo que
está se buscando comparar. Em resumo, a ampliação do uso de unidades
comparativas na história comparada da educação promove uma abordagem mais
rigorosa, crítica e contextualizada, permitindo uma compreensão mais profunda e
significativa dos sistemas educacionais em sua diversidade e complexidade.
Ampliando a sugestão de unidades de análise para uso da História Comparada
da Educação na Educação de Jovens e Adultos (EJA), podemos explorar ainda mais
profundamente esses conceitos e incorporar dimensões relevantes das
subjetividades dos sujeitos, casando-se assim a metodologia comparativa aos
anseios de analises pós-modernas. Citam-se aqui três exemplos em que a
metodologia comparativa pode ser usada, por exemplo, alinhada à subjetividade presente em metodologias como aquelas de narrativas
autobiográficas:
Primeiramente pode se usar a unidade de análise denominada recordações
pessoais escolares. Além de simplesmente considerar as recordações pessoais
como unidades de análise, podem-se investigar como essas recordações são
construídas e influenciadas por diferentes contextos educacionais. Isso envolve
examinar não apenas as experiências individuais dos alunos na educação formal,
mas também como suas experiências de vida e aprendizado fora da escola moldam
suas percepções e atitudes em relação à educação na EJA. Além disso, pode-se
explorar como essas recordações pessoais variam de acordo com fatores como
idade, gênero, etnia e classe social, contribuindo para uma compreensão mais
holística das experiências educacionais dos alunos na EJA.
Em segundo lugar sugere-se o imaginário social como unidade de
análise. Além de analisar o imaginário social em relação à educação na EJA,
pode-se investigar como esse imaginário é construído e negociado em diferentes
contextos sociais e culturais. Isso envolve examinar como as representações
sociais da educação na EJA são produzidas e disseminadas através de diferentes
meios, como mídia, literatura e cultura popular. Além disso, podem-se explorar
como essas representações sociais influenciam as percepções e atitudes das
pessoas em relação à educação na EJA, tanto dentro quanto fora da sala de aula.
Ao examinar o imaginário social em relação à educação na EJA, podemos obter
informações importantes sobre as crenças, valores e ideologias que moldam as
práticas educacionais e as experiências dos alunos.
Por fim, aliado as discussões freirianas de educação, sugere-se pensar as
percepções da EJA por meio da unidade de análise EJA, espaço de inclusão ou
exclusão. Inclusive, além de considerar o espaço de inclusão ou exclusão
como uma unidade de análise pode investigar como esse espaço é negociado e
contestado pelos diferentes atores envolvidos na EJA. Isso envolve examinar não
apenas as políticas e práticas educacionais que governam o acesso e a
participação dos estudantes na EJA, mas também as experiências vividas pelos
alunos dentro e fora da sala de aula. Além disso, pode-se explorar como as
narrativas de inclusão e exclusão são construídas e contestadas pelos educandos, educadores pais, gestores
escolares e outros sujeitos envolvidos na educação na EJA. Ao examinar o espaço
de inclusão ou exclusão nesta modalidade de ensino , podemos identificar
desafios e oportunidades para promover uma educação mais equitativa e inclusiva
para todos os estudantes.
Considerações
A História Comparada da Educação
funciona, por fim, pode funcionar como estrutura para os estudos pós-modernos,
subjetivos e narrativos. Ao invés de deixar-se a proposta de lado pode-se
pensar a comparação como alicerce da subjetividade pós-moderna. Assim, este trabalho,
busca explorar as metodologias comparadas no século XXI como fundamentais para
as abordagens mais pós-modernas empregadas nas principais instituições de
ensino superior do Brasil. Esse enfoque é particularmente relevante na
modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA), onde se entende que tais
metodologias são essenciais. Isso ocorre porque as propostas de estudo nessa
área, motivadas por ideais políticos, devem visar soluções estruturais para os
desafios enfrentados, indo além da análise individual de casos isolados.
Refletir sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA) na América Latina e no
Brasil transcende a mera investigação acadêmica, envolvendo a formulação de
soluções e a implementação de políticas eficazes na área. Nesse contexto, as
metodologias de pesquisa desempenham um papel crucial, pois não apenas
contribuem para o conhecimento acadêmico, mas também servem como ferramentas
para analisar estruturalmente a realidade. Portanto, a metodologia comparada
não pode ser subestimada. Ao contrário, ela se torna fundamental para
compreender as complexidades e nuances das questões enfrentadas pela EJA,
permitindo a identificação de melhores práticas, a adaptação de políticas
educacionais e a promoção de mudanças significativas na educação de adultos na
região.
Contribuição
dos autores:
Vinícius Figueiredo Costa: investigação, concetualização, metodologia,
visualização, escrita (rascunho e original); Regina Magna Bonifácio de Araújo:
investigação, concetualização, escrita (rascunho e original).
Financiamento
Sin financiacion
Conflito
de interesses
Os autores declaram não ter conflitos de interesse.
Implicações
éticas
Os autores declaram que este artigo não tem implicações éticas na sua
redação ou publicação.
Referências bibliográficas
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D’Assunção. “História comparada – um novo modo de ver e fazer a história”.
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Ginzburg,
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Tedeschi. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1980, primeiramente publicado em
italiano, em 1976. Todas as referências são a essa edição. N.T.: Salvo
indicado, utilizamos a edição brasileira para as citações: O queijo e
os vermes, tradução de Maria Betânia Amoroso. São Paulo: Companhia das
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Saviani, Demerval. História Comparada da Educação: algumas aproximações.
História da Educação 5, n.° 10 (2016).
Cómo citar este artículo: Figueiredo Costa, Vinícius; Bonifácio de Araújo,
Regina Magna. “Por uma história comparada da educação de jovens e adultos: uma
defesa à luz da proposta de Saviani” Revista Historia de la Educación
Latinoamericana vol.26 no.44 (2024).
[1] Mestre em Educação pela
UFMG, Técnico em Assuntos Educacionais -pedagogo do CEFET-MG, membro do GEPEJAI
– Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação de Jovens, Adultos e Idosos, da
Universidade Federal de Ouro Preto.
[2] Doutora em Educação pela
UNICAMP, coordenadora do GEPEJAI – Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação de
Jovens, Adultos e Idosos, da Universidade Federal de Ouro Preto,regina.araujo@ufop.edu.br
Correspondencia/Correspondence:
Vinícius Figueiredo Costa. Rua Marcelino Ferreira, 690,
Bairro Santa Inês. Cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. vinnymax1789@yahoo.com.br
[3] Demerval Saviani,
“História Comparada da Educação: algumas aproximações. História da Educação.
Vol. 5, n° 10(2016): 1-12.
[4] Michel de. A Certeau, Escrita
da história/Michel de Certeau; tradução de Maria de Lourdes Menezes
;*revisão técnica [de] Arno Vogel (Rio de Janeiro: Forense Universitária,
1982).
[5] Roger Chartier, A
História Cultural ⎯ entre práticas e
representações (Lisboa: DIFEL, 1990).
[6] Jean Paul Sartre, O
ser e o nada – ensaio de ontologia fenomenológica (Petrópolis: Vozes,
1997).
[7] Jean François Lyotard, A
condição pós-moderna (Rio de Janeiro: José Olympio, 2013).
[8] José D’Assunção Barros,
“História comparada – um novo modo de ver e fazer a história”, Revista de História
Comparada Vol. 1, n.° 1 (2007): 2.
[9] Plutarco, Vidas
Paralelas (Porto Alegre: LPM, 2005).
[10] Para saber mais
recomenda-se a leitura da Revista Magazine que recomenda 5 excelentes artigos
para se entender a Escola de Analles. Cinco artigos sobre a escola dos Annales
e suas abordagens historiográficas. Disponível em: https://hhmagazine.com.br/cinco-artigos-sobre-a-escola-dos-annales-e-suas-abordagens-historiograficas/. Acesso em: 21 de abril de 2024.
[11] Saviani, 2001, p.7.
[12] Saviani, 2001, p.7.
[13] Ibidem, p 8.
[14] Destaca-se aqui o trabalho
de Carlo Guinzburg e a ideia do historiador detetive. GINZBURG, Carlo. The Cheese and the Worms. Traduzido por John and Anne Tedeschi. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1980,
primeiramente publicado em italiano, em 1976. Todas as referências são a essa
edição. N.T.: Salvo indicado, utilizamos a edição brasileira para as
citações: O queijo e os vermes, tradução de Maria Betânia Amoroso.
São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
[15] Ibidem, p.8.
[16] Ibidem, p.9.
[17] Ibidem.
[18] Saviani, 2001, p.14.